12/10/2011

Pogobol

Não tive uma infância cheia de mimos, regalias e presentes. Pelo contrário; minha infância e a do meu irmão foram bem humildes. Não tínhamos os brinquedos da moda, muito menos ganhávamos tudo o que queríamos. Quando meu pai podia comprar alguma coisa era sempre uma versão mais simples ou um brinquedo pirateado mesmo, trazido pelo meu avô diretamente do Paraguai. Quando ele dizia que viajava para o país vizinho de Cometa, eu ficava imaginando como deveria ser viajar pendurado no rabo de um cometa.

Mas foi assim que tive uma Barbie, do Paraguai, mas era uma Barbie, e cigana. Lembro que ela tinha o cabelo muito ruim e eu resolvi cortar para ver se ele crescia mais bonito. Foi uma choradeira e um arrependimento gigantes quando descobri que ele não cresceria.

Naquela época, início dos anos 90, o Natal era esperado durante o ano todo pelas então cinco crianças existentes na família. A gente dormia na sala e acordava no dia seguinte com os presentes que o Papai Noel havia trazido. Uma vez, eu acordei no meio da noite, bem na hora em que meu tio colocava os presentes atrás da cortina. Foi então que descobri que o Papai Noel não existia e contei para os outros.

Também tinha amigo secreto na família e era uma expectativa só. Uma vez ganhei da minha avó uma mochila azul para ir na escola, já que eu iria entrar na primeira série no ano seguinte. Fiz um escândalo dizendo que não queria aquela porcaria, que acabou durando quatro anos e só foi aposentada porque a alça arrebentou.

Na rua onde eu morava tinham muitas crianças da nossa idade (entre 6 e 10 anos). A diversão era garantida com jogos de rua, como Queimada, Amarelinha, Bandeirinha, Pega-pega, Esconde-esconde, Elástico, Taco e muitas outras atividades. Foi numa dessas brincadeiras que meu irmão quebrou a clavícula. E em outra delas eu me escondi na casinha do cachorro da vizinha e acabei passando a noite matando pulga em cima do beliche onde eu dormia.

De vez em quando organizávamos excursões para o parquinho que ficava do outro lado do rio. Era uma aventura pular o córrego para chegar até o local. Uma vez minha prima caiu no esgoto e seu chinelo foi levado pela água. Todo mundo saiu correndo pela rua para chegar lá na frente, na ponte, antes do chinelo e resgatá-lo. Ficamos deitados em cima da ponte com uma varinha esperando o chinelo passar para pegá-lo. E aí se a gente não pegasse. O coro comia em casa com minha avó e minha mãe. Aliás, tenho a impressão de que eu apanhava todos os dias. E merecia, porque só aprontava.

No dia seguinte ao Dia das Crianças ou Natal era uma festa de novos brinquedos na rua. Certo dia, um amiguinho apareceu com uma bicicleta de 18 marchas, a última moda na época. E aí eu e meu irmão também queríamos uma. Como nosso pai não podia comprar, tratou de arrumar uma bicicleta usada pra gente. Ela era pequena, amarela e branca, feia que dava dó, mas nos levava para os mesmos lugares que a bonitona de 18 marchas.

Mas aí veio uma menina com uma caixa registradora pra gente brincar de supermercado, e a bicicleta foi deixada de lado. E não era só isso. Tinha também o Jogo da Vida, Banco Imobiliário, Pula Pirata, Pesca Peixe, patins de quatro rodas (duas na frente e duas atrás, com uma presilha para prender no tênis) e muitas outras novidades que faziam a alegria da vizinhança, porque no final das contas todo mundo se divertia com os brinquedos de todo mundo.

Foi numa dessas datas em que se ganha presentes da moda que um vizinho ganhou um pogobol, o brinquedo que mais marcou a minha infância. Era uma bola laranja, cortada ao meio por um anel amarelo. Parecia o planeta Saturno. A gente tinha que se equilibrar para subir no brinquedo e ficava com a meia bola laranja entre os pés. Daí era só sair pulando pela rua, quintal ou qualquer outro lugar. Formava-se fila para pular no pogobol do vizinho. Num dia, eu resolvi pular descalça. Brinquei tanto que as laterais dos meus pés ficaram cheias de bolhas. Mas isso não era problema. No dia seguinte, era só enfiar o tênis chinezinho nos pés, botar a mochila azul nas costas e ir para a escola, na expectativa de voltar logo pra casa para poder brincar na rua até as oito e meia da noite, quando minha mãe começava a gritar meu nome e do meu irmão. E aí da gente se não aparecesse. Íamos dormir com a bunda quente, como ela dizia.

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